sexta-feira, 14 de maio de 2010

COISA DE CRIANÇA

Na rua onde morava um conhecido e antipático General do Exército, morava também um paraguaio cujos filhos passavam o dia jogando futebol com bola de meia.
Às vezes acontecia de cair uma ou outra em sua casa. Nada mais natural, coisa de criança.
Sempre com um linguajar desprovido de qualquer polidez, expulsava os garotos assegurando que os mandaria de volta para o Paraguai voando como aviõezinhos de papel, caso não tomassem mais cuidado ao brincar. Atônitos, os meninos sempre saíam correndo em busca de novos pares de meia para confeccionar novas bolas.
Popular pelo seu indelicado tratamento com que se relacionava, era temido por todos no bairro. Confesso que eu tremia só de vê-lo abrir aquela boca coberta pelo imenso bigode. As crianças já não mais se importavam; adoravam vê-lo enraivecido. Ele bufava feito animais em toradas.
- Da próxima vez que essa porcaria cair aqui, eu acabo com a vida de vocês – esbravejava o General.
Foi ficando engraçado. Os meninos começaram a irritá-lo de propósito. Todos os dias atiravam os objetos lá. Raramente conseguiam recuperar, já que o velho jogava cada bola em um balde de álcool e ateava fogo.
Ah, mas isso nunca seria preocupação. O pai comercializava meias numa loja na mesma rua. Meias não faltariam: cores, modelos e tamanhos variados. Fazer bolinhas era especialidade deles. Garantiam, ainda, que era muito divertido tê-las como brinquedo.
E foram infinitas bolas perdidas, ou melhor, queimadas. De vez em quando, nas tardes em que o general cochilava, algumas eles pegavam de volta. Na verdade, ultimamente jogavam-nas no quintal de casa só para chegarem até mim para conversar e rir um pouco. Tornei-me um aliado deles.
Só que essa história eu vos conto somente agora porque antes eu não podia nem abrir o bico. O homem berrava comigo! Não me dava água, nem comida.
De que adiantou? Seu fim? Queimado, carbonizado como as meias.
Há duas semanas, na ocasião em que foi atingido na cabeça por uma bolinha branca de seda, ficou tão furioso que espalhou tanto álcool em torno do balde para queimar o brinquedo, que o fogo alastrou-se por toda a casa. Eu escapei porque me debati feito doido na gaiola e voei.
Agora não sou mais um papagaio mudo. Meus amigos me adotaram e hoje posso tagarelar e contar muita coisa que presenciei ali.
Olha... Tem cada história! Qualquer dia desses, eu conto mais uma.
Promessa de papagaio!

Obs.: Conto escrito na escola há alguns anos, selecionado em sétimo lugar em um concurso internacional literário

16 comentários:

  1. Oi Lucimara
    Muito bom, surpreendente o final. No início pensei ser você narrando suas memórias. Parabéns.
    Bjs

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  2. Olá linda menina, sabe que no final, acho que todos nós temos um pouco desse papagaio e uma hora nos libertamos... beijos no seu coração, saudade da sua presença em meu cantinho....


    Rosana Morena!

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  3. Lucimara, obrigada pelo convite.

    Adorei o seu conto, especialmente o desfecho.

    Bjs e inté!

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  4. bom conto...
    apreciei muito o twist final e... fico esperando as sequelas.
    abs

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  5. kerida Luci

    ...muito obrigada pelo convite.

    ...adorei este teu cantinho.
    como eu adoras escrever.
    fazes transparecer esse segredo!

    xis da létinha

    http://birdfleur.blogspot.com/
    http://letinhaletinha.blogspot.com/

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  6. Así será, bella Lucimara, procuraré visitarte algo más a menudo. Agradezco mucho tu visita y comentario en mi espacio. Gracias por seguirme.
    Abrazos tiernos.

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  7. O texto é ótimo. Mereceu ser classificado.

    Um grande abraço, amiga.
    Bom fim de semana.

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  8. Suas histórias são tão ricas que parecem verossímil, D+ o narrador ser um papagaio. Bjos.

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  9. Oi menina, recebi o seu email e vim conhecer o seu blog adorei esse texto, ele realmente mereceu ser classificado.

    Parabéns pelo blog, passei aqui rapidinho depois vou ler todos os seus textos.

    beijos

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  10. Olá, Amigos,
    Obrigada pela participação. É sempre muito bom poder contar com as visitas de vocês.
    Obrigada de coração!
    Continuem acompanhando. Posto às sextas-feiras.
    Ótima semana!

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  11. Hehehe...muito legal, Luciana. Tens a arte das palavras e da escrita, parabéns!!! Um bom dia, uma ótima semana para você! Beijos, ;)

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  12. Lu.... pra variar, maravilhoso o seu texto!
    Parabéns amiga! Seja sempre este papagaio tagarela do final e nos conte suas histórias! E que venha a próxima... rs

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  13. kerida Amiga

    ...gosto muito do teu "cantinho"!

    ...adoro "andar" por aqui.

    xis létinha

    http://birdfleur.blogspot.com/
    http://letinhaletinha.blogspot.com/

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  14. Querida amiga.

    Penso que ao relembrar este conto,
    também relembraste momentos
    que vivestes quando o escreveu.
    Palavras são assim.
    Nas linhas e entrelinhas
    nos falam e inspiram sorrisos,
    e nos devolvem lembranças
    que as vezes ficam
    esquecidas no tempo.

    Uma linda semana para ti.

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  15. Amorzão, que texto bem elaborado e merecedor de sua colocação no concurso internacional. Até o final pensei que era vc contando sobre sua infância...rsrsrs.
    Aqui na rua de casa tinha uma senhora que sempre pegava nossas bolas e rasgava quando caia na casa dela. Mas ai íamos nos revezando até a casa e tocávamos a campainha e saia correndo...ela ficava muito brava e xingava tudo...rsrsrsrs.
    As vezes tenho saudades desses tempos e dessas brincadeirinhas...rs
    Espero na sexta-feira pelo novo post.

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